+55 (41) 9 8445 0000 arayara@arayara.org

Leilão A-5 de energia pode afetar comunidades indígenas e quilombolas e gerar altas emissões de gases de efeito estufa

A Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) marcou para 22 de agosto de 2025 o Leilão de Energia Nova “A-5”, destinado à contratação de hidrelétricas com início de operação previsto para 2030. O certame, que deve movimentar bilhões em investimentos, já desperta preocupações sobre impactos socioambientais, sobretudo para comunidades indígenas, quilombolas e ecossistemas amazônicos.

Segundo a Empresa de Pesquisa Energética (EPE), foram cadastrados 241 projetos, somando quase 3 mil megawatts (MW) de potência — o maior volume já registrado em um leilão do tipo. A maioria é formada por Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs), seguidas de Centrais Geradoras Hidrelétricas (CGHs) e Usinas Hidrelétricas (UHEs) de até 50 MW. Os projetos estão distribuídos em 15 estados, com forte presença no Centro-Oeste, Sul, Minas Gerais e Pará.

Risco para povos tradicionais

 

Dados do Monitor da Energia, do Instituto Internacional ARAYARA, indicam que parte dos projetos hidrelétricos cadastrados na ANEEL — com Despacho de Registro do Requerimento de Outorga (DRO) e menos de 50 MW de capacidade instalada — podem estar localizados dentro da chamada zona de influência de terras indígenas (TIs) e quilombolas (TQs). Pela Portaria Interministerial nº 60/2015, hidrelétricas na Amazônia devem respeitar um raio mínimo de 40 km dessas áreas — 15 km nas demais regiões — para evitar impactos diretos.

A Convenção 169 da OIT, da qual o Brasil é signatário, também determina a realização de consulta livre, prévia e informada antes da implementação de qualquer projeto que possa afetar povos tradicionais. “O que se vê é que muitos projetos chegam ao leilão sem que esses direitos tenham sido garantidos, o que pode resultar em conflitos socioambientais e processos judiciais”, alerta a pesquisadora e PhD em energia Hirdan Costa, colaboradora da ARAYARA.

Energia “limpa” que pode poluir

 

Estudos  técnicos como o de Mariana Maia de Miranda (USP, 2013) mostram que, apesar de amplamente divulgadas como energia limpa, hidrelétricas — especialmente em regiões tropicais — podem emitir grandes quantidades de gases de efeito estufa (GEE), como metano (CH₄) e dióxido de carbono (CO₂), devido à decomposição de matéria orgânica submersa após o enchimento dos reservatórios.

Segundo Costa, é comum que as hidrelétricas sejam rotuladas como “limpas”, principalmente por não queimarem combustíveis fósseis no processo de geração de eletricidade. No entanto, essa classificação ignora aspectos críticos relacionados às emissões indiretas e ao ciclo de vida do empreendimento

O engenheiro climático e de geociências  da ARAYARA, Joubert Marques, aponta que essas emissões decorrem da decomposição da matéria orgânica soterrada e inundada com a criação do reservatório, cujos principais fatores são: o volume e o tipo de biomassa submersa, a profundidade do lago e a área alagada em relação à energia gerada. Marques ressalta que reservatórios tropicais podem emitir até 20 vezes mais GEE do que os de regiões temperadas, o que compromete a imagem de neutralidade de carbono frequentemente atribuída às hidrelétricas.

“O leilão A-5 não exige avaliação do ciclo de vida das usinas nem prevê condicionantes para reduzir essas emissões. É um modelo ultrapassado, que mascara o impacto climático real”, alerta.

Comunidades e clima em jogo

 

Se implementados sem estudos aprofundados e salvaguardas adequadas, os projetos do Leilão A-5 podem comprometer não apenas ecossistemas e modos de vida tradicionais, mas também as metas brasileiras de neutralidade de carbono até 2050.

“Contratar energia sem contabilizar sua pegada de carbono completa é transferir os custos climáticos para toda a sociedade”, conclui  o gerente de Geociências, George Mendes.

A ARAYARA defende que o governo e os órgãos ambientais assegurem a aplicação da Portaria Interministerial nº 60 e da Convenção 169 da OIT, ampliem a transparência do processo e exijam métricas de emissões no licenciamento ambiental para que a expansão energética seja, de fato, sustentável.

 

Compartilhe

Share on whatsapp
WhatsApp
Share on facebook
Facebook
Share on twitter
Twitter
Share on linkedin
LinkedIn

Enviar Comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Redes Sociais

Posts Recentes

Receba as atualizações mais recentes

Faça parte da nossa rede

Sem spam, notificações apenas sobre novidades, campanhas, atualizações.

Leia também

Posts relacionados

Aviso de Convocação – Assembleia Geral Ordinária

O Instituto Internacional ARAYARA convoca os(as) associados(as) com filiação regular e quites com as taxas anuais e remidas, e que estejam em pleno gozo de seus direitos estatutários, para a Assembleia Geral Ordinária a ser realizada em formato híbrido no dia 18 de dezembro de 2025, às 18h30 em primeira chamada e às 19h00 em segunda chamada. A participação poderá

Leia Mais »

Audiência pública sobre o fracking no STJ : uma das maiores ameaças à saúde humana e prejuízos ao agronegócio e às mulheres do Brasil

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) sedia, no dia 11 de dezembro de 2025, uma audiência pública de importância crucial para o futuro energético e ambiental do Brasil. O evento coloca em debate a exploração de gás de xisto (shale gas) por meio do fraturamento hidráulico (fracking), uma técnica não-convencional que, segundo dados e subsídios científicos compilados pelo Instituto Internacional

Leia Mais »

ARAYARA na Mídia: Roteiro brasileiro para fim dos combustíveis fósseis começa a sair do papel

Lula dá 60 dias para os ministérios do Meio Ambiente, Fazenda e Minas e Energia, e Casa Civil apresentarem as diretrizes para a transição energética justa, mas condiciona financiamento à exploração de petróleo e gás O despacho publicado ontem no Diário Oficial da União onde o presidente Lula convoca os ministérios de Minas e Energia, Fazenda e Meio Ambiente e mais a

Leia Mais »

ARAYARA na Mídia: Direitos humanos e violência política são temas de roda de conversa nesta quarta (10)

A atividade realizada no Dia Internacional dos Direitos Humanos, acontece na sede da Sociedade Protetora dos Desvalidos (SPD) Nesta quarta-feira, 10 de dezembro, Dia Internacional dos Direitos Humanos, roda de conversa sobre Direitos Humanos e Violência Política, acontece às 9h, na Sociedade Protetora dos Desvalidos (SPD), no Pelourinho. O encontro, iniciativa da vereadora Eliete Paraguassu (PSOL), tem como objetivo fortalecer a

Leia Mais »