+55 (41) 9 8445 0000 arayara@arayara.org

Belém em Alerta: Painel na COP30 Expõe Racismo Ambiental e o Legado de Violações em Grandes Eventos

A crise climática não é apenas ambiental, é uma crise de direitos humanos, e o seu impacto recai de forma desproporcional sobre populações negras, periféricas e de baixa renda. Essa foi a tese central do debate “Racismo Ambiental e os Impactos Locais de Grandes Eventos: O Caso de Belém e a Justiça Climática Territorial”, promovido pela Anistia Internacional Brasil no ARAYARA Amazon Climate Hub.

O painel trouxe o caso de Belém, cidade-sede da COP30, para discutir como obras e projetos de grande porte, como a Conferência, podem agravar violações territoriais e o racismo estrutural.

Crise Climática é Crise Racial

Jurema Werneck, diretora executiva da Anistia Internacional e enviada especial para a Igualdade Racial e Periferias na COP30, abriu o debate destacando a urgência de agir.

“Os problemas que já existiam se tornam mais agudos diante da crise climática, o ciclo de injustiças e violações se intensifica,” afirmou. “Se a crise climática é uma emergência, a resposta de direitos tem que ser emergencial também.”

Ygor Sarmanho, também da Anistia Internacional, reforçou que o Pará é o estado que mais mata defensores no país e enfrenta conflitos territoriais históricos. Ele sublinhou que a exploração de combustíveis fósseis é a base dessas violações, gerando “zonas de sacrifício” onde as populações afetadas são, majoritariamente, negras – um retrato do racismo ambiental.

A fala de Jurema ecoou um chamado à ação: “O legado da COP30 tem que ser um legado de desobediência e insurgência. De não aceitar aquilo que já está posto. Desobedecer a regra do jogo.”

Urbanismo Excludente e a Escolha Política da Precariedade

O debate aprofundou como o racismo estrutural se manifesta no desenho do território urbano. Dra. Luciana Albuquerque, da Defensoria e Clínica Multiversidades, ressaltou que os efeitos da crise climática são sentidos de formas extremas nas periferias, onde a temperatura pode ser até 10 graus mais alta que nos centros.

“O urbanismo clássico que foi adotado no Brasil empurra para as periferias de forma higienista, para não ‘poluir’ a paisagem urbana,” disse a Doutora.

Essa exclusão histórica, descendente de um racismo estrutural, impede o acesso formal à terra para a população racializada e de baixa renda, empurrando-as para territórios ambientalmente mais vulneráveis. Dra. Luciana enfatizou que é preciso um olhar multiprofissional para a assistência técnica e uma construção coletiva com a comunidade, valorizando os saberes tradicionais no manejo da terra.

Dr. Adrião Oliveira, do Núcleo de Direito à Moradia da Defensoria Pública, trouxe dados de Belém: 57% da população vive em situação de irregularidade fundiária, caracterizando uma “escolha política” que é legitimada por um contexto judicial segregador.

Obras da COP30: Um Exemplo de Racismo Ambiental

Os participantes citaram projetos urbanos recentes para ilustrar o racismo ambiental na cidade. Dr. Adrião criticou obras realizadas próximas à Vila da Barca:

“Na Vila da Barca fizeram uma doca para os ricos, investiram milhões, e o tratamento do esgoto foi colocado ao lado da Vila da Barca, sendo que a Vila não recebe tratamento. Isso caracteriza o racismo ambiental.”

Outro exemplo foi a construção da Rodovia da Liberdade, que envolveu desmatamento e afetou um quilombo vizinho sem consulta prévia. Dra. Luciana complementou, destacando a falha do sistema de licenciamento:

“Não existe licenciamento social, apenas ambiental. No licenciamento dessa obra, não constava nada pensando nas comunidades, então a vida dessas populações não importa para o estado, e isso é um traço do racismo ambiental.”

O legado da COP30, segundo os especialistas, deve ser o reconhecimento da resistência nas periferias, a regularização fundiária e a garantia de que as populações da Amazônia deixem de ser tratadas como objeto em projetos de “desenvolvimento”.

Foto: Odaraê Filmes

Compartilhe

Share on whatsapp
WhatsApp
Share on facebook
Facebook
Share on twitter
Twitter
Share on linkedin
LinkedIn

Enviar Comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Redes Sociais

Posts Recentes

Receba as atualizações mais recentes

Faça parte da nossa rede

Sem spam, notificações apenas sobre novidades, campanhas, atualizações.

Leia também

Posts relacionados

ARAYARA na Mídia: Brazil’s Congress defies Lula to push through “devastation bill” on COP30’s heels

NGOs say the new environmental licensing rules to fast-track mining, energy and infrastructure projects will sweep away existing safeguards, undermining the country’s climate pledges in Belém Brazil’s Congress has pushed through legislation to weaken environmental safeguards for mining, infrastructure and agricultural projects, overriding a partial presidential veto just days after the end of COP30 and setting the stage for a possible showdown

Leia Mais »

Leilão de áreas do Pré-Sal expõe contradição da política energética brasileira e afasta Petrobras da transição energética justa

Leilão de áreas do Pré-Sal pela PPSA ignora tendência global de queda do petróleo e compromete estratégia climática brasileira São Paulo, 04 de dezembro de 2025 – O Primeiro Leilão de Áreas Não Contratadas do Pré-Sal representa mais um passo na contramão da transição energética que o Brasil afirma liderar, ampliando a entrega de recursos estratégicos a empresas privadas nacionais

Leia Mais »

ARAYARA na Mídia: Licença especial acelera licenciamento para empreendimentos que vão do agro à exploração de petróleo na Amazônia

Por Fábio Bispo – InfoAmazônia Parte central de medida provisória aprovada pela Câmara nesta terça-feira (3), a nova Licença Ambiental Especial (LAE) prevê o prazo máximo de até 1 ano para licenciar projetos considerados ‘estratégicos’ pelo governo. Especialistas alertam para afrouxamento de regras para grandes projetos da agropecuária extensiva, mineração e exploração de petróleo. Um relatório redigido e alterado seis

Leia Mais »

Licenciamento especial vai à sanção e ONGs prometem judicializar

Organizações ambientais prometem judicialização de alterações no licenciamento de grandes projetos no Brasil Por Nayara Machado – Eixos NESTA EDIÇÃO. Senado aprova MP do licenciamento especial em votação simbólica. Texto vai à sanção. ONGs classificam mudanças na lei como retrocesso ambiental e prometem levar à Justiça. Em uma votação simbólica na tarde desta quarta (3/12), o Senado aprovou a conversão em

Leia Mais »