Ao longo desta segunda-feira (03), em Brasília, ocorreu a reunião de instalação do Plenário do Fórum Nacional de Transição Energética (FONTE), mecanismo consultivo da Política Nacional de Transição Energética (PNTE). Após mais de sete meses desde o processo eleitoral, o FONTE iniciou efetivamente suas atividades, em um encontro que reuniu representantes do governo federal, iniciativa privada e sociedade civil. Entre as organizações representadas, estiveram o Instituto Internacional ARAYARA, que assumiu como titular na cadeira de Petróleo e Gás, e o Programa Fé, Paz e Clima, que ocupou a vaga referente a povos e comunidades tradicionais. A ARAYARA foi representada por sua diretora executiva, Nicole Figueiredo de Oliveira, com Renata Prata, coordenadora de advocacy e projetos da organização, como suplente. Já pelo Programa Fé, Paz e Clima, tomaram posse Juliano Bueno de Araújo, também diretor técnico da ARAYARA, como titular, e John Wurdig, gerente de transição energética, como suplente.
A reunião — realizada a apenas uma semana da COP30 e após meses de atraso na instalação do FONTE — foi marcada por expectativas e também por críticas. Para as organizações da sociedade civil, o intervalo entre a eleição e a posse comprometeu o papel estratégico do Fórum, que deveria ter contribuído previamente para o posicionamento do Brasil na Conferência do Clima, especialmente diante da abertura para exploração de petróleo na Foz do Amazonas e de decisões recentes que reforçaram a expansão fóssil no país.
Em ofício protocolado em 28 de outubro ao MME e ao Plenário do FONTE, a ARAYARA manifestou preocupação com a condução dos workshops do Plano Nacional de Transição Energética (PLANTE) — instrumento que definirá ações e metas de longo prazo para implementar a Política Nacional de Transição Energética (PNTE). A organização destacou que o Plante e o Fórum Nacional de Transição Energética (FONTE) são instâncias complementares: cabe ao PLANTE estruturar o caminho da descarbonização no país, enquanto o FONTE, mecanismo consultivo permanente, existe justamente para assegurar participação social qualificada e apoiar a formulação, implementação e monitoramento dessa estratégia. A entidade, porém, apontou a contradição central do processo: a primeira reunião do FONTE ocorreu ontem, 3 de novembro, enquanto o primeiro workshop do PLANTE está previsto já para o dia 7, impedindo que as instituições eleitas tenham tempo para organizar uma contribuição, comprometendo a qualidade.
O documento também criticou a concentração geográfica das atividades do PLANTE em São Paulo, Brasília e Rio de Janeiro, sem contemplar Norte, Nordeste e Sul, o que, segundo a ARAYARA, “exclui e silencia” territórios e comunidades diretamente afetadas pela agenda energética. A entidade ainda cobrou maior acessibilidade e transparência — já que não houve apoio para deslocamento de representantes e tampouco oferta de participação virtual — e alertou para o conflito de agenda com a COP30, em Belém, entre 7 e 13 de novembro, que dificultará a participação de especialistas e lideranças engajadas na Conferência. Por fim, registrou o atraso de mais de sete meses entre a eleição e a instalação do FONTE, período no qual avançaram decisões estratégicas sem debate no âmbito do Fórum, incluindo a 5ª Oferta Permanente da ANP, a licença de teste para exploração de petróleo na Foz do Amazonas e o leilão de contratação de energia a carvão pela Aneel.
Durante a reunião, o suplente John Wurdig apontou lacunas no PLANTE: ausência de diretrizes para descomissionamento de térmicas, tratamento de passivos ambientais e contaminações. Defendeu incluir a Lei 14.029 — que, segundo ele, “faz a transição do carvão para o carvão” — e citou a ADI 7095 da ARAYARA, lembrando que o próprio MMA já questionou a constitucionalidade da norma. Alertou para a construção de políticas “pró-fóssil” e cobrou metas e prazos claros para a saída dos combustíveis fósseis, além de maior ênfase a “emergência climática”, trabalhadores e Acordo de Paris, termos pouco presentes no texto preliminar.
Para a diretora executiva da ARAYARA, Nicole Figueiredo de Oliveira, a instalação do FONTE tem o desafio de enfrentar a desconexão que existe entre o discurso oficial e a prática no campo da transição energética. “O desafio está lançado com a primeira reunião do FONTE, fórum nacional de transição energética que tem uma representação tripartite entre governo, sociedade civil e setores privados, tendo a elite do pensamento e gestão energética do Brasil presentes! O papel da sociedade será crucial em alinhar investimentos, tecnologias e o enfrentamento à crise climática que tem os combustíveis fósseis como sócios.”
Representando o Programa Fé, Paz e Clima, Juliano Bueno de Araújo reforçou a importância da participação social e da centralidade dos territórios nos debates. “Vejo um momento histórico na construção de um novo capítulo sobre a transição energética justa, sustentável e verdadeira que o Brasil tanto demanda e necessita. O desafio é grande, e a sociedade está pronta para dizer o que necessita e demanda para o governo e para o setor privado.”
A sessão de instalação foi realizada no auditório do Observatório Nacional da Transição Energética no MME, e apresentou o regimento interno e o plano de trabalho preliminar para 2026. Tanto ARAYARA quanto o Programa Fé, Paz e Clima afirmaram que atuarão de maneira propositiva e vigilante para garantir que o FONTE cumpra seu papel de orientar políticas públicas com base na ciência, na participação social e na justiça climática — princípios essenciais para o Brasil avançar rumo a uma transição energética verdadeiramente justa, democrática e alinhada aos compromissos climáticos internacionais.














