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Arayara propõe soluções para descontaminar rio de Santa Catarina, poluído por rejeitos da mineração de carvão

Organização defende uso de recursos existentes em fundos dos governos estadual e federal para reverter passivos ambientais da indústria carbonífera no estado

A urgência em recuperar e conservar o rio Mãe Luzia – importante manancial para  a cidade de Siderópolis e região – foi consenso no debate público realizado na noite dessa terça-feira (16/8), na Câmara de Vereadores do município catarinense, que fica a cerca de 200 km ao Sul da capital Florianópolis. O encontro foi articulado pelo Instituto Internacional Arayara junto ao legislativo municipal, a pedido de produtores rurais ribeirinhos, que denunciaram indícios de contaminação do rio Mãe Luzia por rejeitos da extração de carvão mineral. Participaram do debate representantes da comunidade, órgãos municipais e estaduais, empresários, agropecuaristas, mineradores e ambientalistas.

 

O diretor da Arayara.org, Juliano Bueno de Araújo, destacou que a organização vem empreendendo esforços para que os municípios catarinenses impactados pela atividade carbonífera, incluindo Siderópolis, possam ser ressarcidos pelos danos ao meio ambiente e à saúde da população. “O Instituto Arayara trabalha em defesa da vida e de cada um dos trabalhadores que estão aqui. Nós nos colocamos à inteira disposição do sindicato dos mineradores, do legislativo municipal, da prefeitura, no sentido de darmos prosseguimento aos adequados acordos, que visam à recuperação das áreas, a indenização do povo de Siderópolis e dos 21 municípios que foram atingidos pelos passivos ambientais das décadas de exploração carbonífera”, afirmou, ao defender alternativas sustentáveis para o desenvolvimento econômico da região e uma transição energética justa e inclusiva. 

 

Ainda de acordo com Araújo, a Arayara.org vai propor a destinação de recursos do Fundo Estadual do Meio Ambiente e do Fundo de Recuperação e Restauro da Mineração para a revitalização do rio Mãe Luzia e de outros corpos hídricos das bacias hidrográficas, que se encontram há décadas contaminadas por rejeitos de carvão mineral.

 

Contaminação recorrente

Segundo relato de agricultores que vivem próximos ao rio Mãe Luzia e utilizam suas águas para o cultivo agrícola, pesca e dessedentação de animais, o rio – que por décadas sofreu com a contaminação por metais pesados e outros resíduos da extração do carvão –  vinha demonstrando sinais de recuperação. No entanto, recentemente, o rio voltou a apresentar coloração alaranjada, característica da poluição por pirita – um dos principais rejeitos da mineração carbonífera.

 

“Há uns três anos venho observando que o rio ressuscitou, as pedras ficaram limpas e os peixes voltaram. De três ou quatro meses para cá, voltei a me decepcionar. Os peixes sumiram e a qualidade da água vem se deteriorando cada vez mais. Estou muito preocupado com um patrimônio que é de todos nós”, afirmou o Angelo Natal Périco, que é professor e um pequeno produtor rural ribeirinho, observador constante do rio Mãe Luzia. “Se o setor (de mineração) não tem capacidade de manter um mecanismo limpo, temos que mudar a matriz (energética)”, defendeu.

 

Outro relato incisivo partiu da professora do ensino fundamental, Miriam da Conceição Martins. Ela lembrou de como o rio foi maltratado pela indústria carbonífera, desde a década de 1940 e expôs as iniciativas lideradas pelo Fórum de Recuperação e Revitalização do rio Mãe Luzia, criado em 2014, para cobrar do poder público ações para reverter os passivos ambientais não só da mineração, como do déficit de saneamento básico e do uso indiscriminado de agrotóxicos, que também agravam a deterioração dos recursos hídricos.

 

Recuperação de áreas degradadas

Outro ponto de consenso foi a necessidade de se identificar a origem da contaminação e a urgência em se recuperar as áreas degradadas pela exploração do carvão, que integram a ação civil pública, conhecida como ACP do Carvão, proposta em 1993 pelo Ministério Público Federal (MPF). São cerca de 6 mil hectares que estão nessa ACP. 

 

Segundo informações do gerente de Desenvolvimento Ambiental do Instituto do Meio Ambiente de Santa Catarina (IMA), Marcos Favro, que esteve representando o órgão no debate, há ainda cerca de 1,3 mil hectares de áreas degradadas, que continuam impactando o rio Mãe Luzia. “O rio está recebendo muita contribuição de áreas que ainda não foram tratadas. Estamos falando de uma área contaminada por ferro e metais pesados, que estão sendo depositados no rio”, relatou.

 

Favro afirmou que o IMA vem investigando possíveis causas da coloração diferenciada no rio, que pode ser decorrente dos passivos deixados pela mineração do passado como outras atividades extrativistas que ainda acontecem na região. “Achamos louvável essa discussão até para poder convergir para uma melhoria porque temos aqui a comunidade, que depende da água, e temos os mineiros, que precisam ter o seu trabalho resguardado”, disse o representante do IMA. “A recuperação das áreas degradadas é importantíssima para melhorar a condição das águas dos rios, tanto do Mãe Luzia quanto de outros que temos na nossa região”, concluiu.

 

O representante da Fundação de Meio Ambiente de Siderópolis (Famsid), Vinícius Pasquali, também falou da necessidade de agilizar a recuperação das áreas degradadas da ACP do Carvão. Ele fez questão de salientar de que hoje há um regramento para a atividade de mineração carbonífera que precisa ser respeitado. Admitiu que foi constatada coloração alaranjada na água do rio Mãe Luzia, depois da denúncia feita por moradores, mas que não constatou lançamento irregular de efluentes da mineração de empresas em atividade. A suspeita seria de carreamento de rejeitos de minas desativadas para o leito do rio, um relatório com mais informações será disponibilizado em breve.

 

Ambientalistas são hostilizados

Nem tudo foi consensual durante o debate na Câmara de Siderópolis. Representantes do setor de mineração tentaram, em vários momentos, tumultuar a reunião, que foi conduzida pelo vereador Dener Nazari e contou com a participação, ainda, da vereadora Jadna Rodrigues. Uma das diretoras do Instituto Arayara foi verbalmente agredida por pessoas que se disseram ligadas ao sindicato que representa os mineiros, eles fizeram discursos em tom de ameaça e já haviam chutado o carro da Arayara.org na entrada do evento. Por segurança, os representantes do instituto saíram da câmara de vereadores sob escolta da Polícia Militar.

 

Não só os ambientalistas foram hostilizados. Representantes da comunidade de Siderópolis, que denunciaram a contaminação do rio, também foram interrompidos durante seus relatos. Nelson Zampolli foi um deles. Minerador aposentado e produtor rural na comunidade Rio Jordão, fez questão de continuar sua fala de que o rio Mãe Luzia vem há meses sendo poluído e que os peixes sumiram. “Não tenho nada contra os mineiros. Eu mesmo já fui mineiro”, disse o morador, defendendo-se das intervenções à sua fala. “Mas o que adianta os colonos preservarem (mantendo áreas de reserva natural nas propriedades) e continuarem poluindo (o rio)”, acrescentou Zampolli.

 

Assista a íntegra do debate público que foi transmitido pela WEB TV SIDERA, canal local que vem acompanhando as denúncias.

 

A sociedade unida lutando em prol do Rio Mãe Luzia é um exemplo na preservação das bacias hídricas do sul de Santa Catarina, tão castigadas pela exploração do carvão mineral.

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