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ARAYARA na Mídia: Como a proposta de Alcolumbre adotada por Lula deve acelerar obras de impacto na Amazônia

Modalidade especial prioriza projetos considerados estratégicos pelo governo. Ambientalistas veem risco de uso de critérios políticos. Senador tem defendido celeridade e ministério diz que parâmetros técnicos serão adotados

Qual é o papel e a importância do Brasil na COP?

A Licença Ambiental Especial (LAE) – parte do novo licenciamento ambiental aprovado em agosto – deve acelerar a aprovação de empreendimentos de grande porte na Amazônia. Alguns exemplos são o asfaltamento da BR (Manaus-Porto Velho), hidrovias no Rio Araguaia e a Ferrogrão, de Mato Grosso ao Pará.

A LAE foi incluída no licenciamento ambiental pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União‑AP) e depois transformada em Medida Provisória (MP) pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O modelo cria um rito simplificado para obras classificadas por um conselho de governo como “estratégicas” e impõe prazo máximo de doze meses para a análise desses pedidos de empreendimentos.

Ambientalistas veem risco de uso de critérios políticos em detrimento dos técnicos na priorização dos projetos. Também apontam que o limite de um ano é curto para cumprir as três fases de análise previstas na nova regra.

Entidades ligadas ao setor de infraestrutura, por sua vez, têm defendido desburocratizar trâmites e criticam a necessidade de um novo processo de licenciamento para cada projeto aberto em uma mesma área.

Ao propor a emenda, Alcolumbre disse que a mudança daria “celeridade e eficiência” para investimentos vitais. Procurado pelo Estadão, o parlamentar não falou. Um dos projetos de interesse do presidente do Senado é a exploração de petróleo na Margem Equatorial da Foz do Rio Amazonas, o que deve gerar receitas para o Amapá, seu Estado natal.

O Ministério do Meio Ambiente, em nota, afirma manter os compromissos climáticos, com a biodiversidade e os povos tradicionais (leia mais abaixo). Já a Petrobras diz seguir as exigências dos órgãos ambientais em seus licenciamentos.

Ao sancionar o novo licenciamento aprovado pelo Legislativo, Lula vetou 63 dispositivos que flexibilizavam regras. Em aceno para Alcolumbre, porém, transformou a emenda da LAE em Medida Provisória – em vigor desde agosto.

O Congresso iria votar nesta quinta-feira, 16, quais vetos seriam derrubados, mas a sessão foi cancelada. Há temor de desgaste às vésperas da Cúpula do Clima das Nações Unidas (COP-30), que será em Belém no próximo mês. Uma estratégia dos parlamentares, revela a Coluna do Estadão, será retomar flexibilizações vetadas no texto da MP da licença especial.

O que os ambientalistas criticam?

Na formulação atual, a Licença Especial seria um “cheque em branco” para projetos de alto risco ambiental e social, avalia o Grupo de Trabalho Infraestrutura e Justiça Socioambiental (GT Infra), que reúne mais de 50 organizações pró-desenvolvimento sustentável.

Entre os pontos críticos, na avaliação de especialistas, estão:

a ausência de definição sobre o que é considerado estratégico; a manutenção de procedimento simplificado de licenciamento, inclusive quando há exigência de Estudo de Impacto Ambiental (EIA), com prazo máximo de 12 meses.

Na prática, as disposições simplificam o licenciamento de projetos de transporte (rodovias, ferrovias e hidrovias), mineração, hidrelétricas e perfurações de petróleo, incluindo obras do novo Plano de Aceleração do Crescimento (PAC).

O Ministério do Meio Ambiente diz que a definição para projetos estratégicos, das equipes de analistas ambientais dedicadas a isso e outros detalhes sobre o procedimento da LAE serão regulamentados.

O Conselho de Governo definirá os empreendimentos prioritários. O órgão, com representantes de 11 ministérios (como Meio Ambiente, Transportes e Minas e Energia), teve seu formato definido pelo governo nessa quarta-feira, 15, mas ainda não foi indicada data para reunião.

No texto original de Alcolumbre, era previsto rito único de análise na LAE, mas a nova versão prevê três etapas. Especialistas, porém, apontam que na prática o limite de um ano é curto para o rito trifásico (que se divide entre licença prévia, de instalação e operação e costuma ser aplicado à maioria dos projetos de grande impacto).

“Na maior parte dos grandes empreendimentos, a LAE é inexequível”, afirma Suely Araújo, ex-presidente do Ibama na gestão Michel Temer (MDB).

Para ela, hoje coordenadora de políticas públicas do Observatório do Clima, o novo modelo expõe uma visão de que o licenciamento é entrave burocrático e não um processo para que os projetos passem por adequações ambientais.

Conforme o Ministério do Meio Ambiente, “o maior tempo despendido nesse tipo de projeto é para a elaboração dos estudos por equipes especializadas contratadas pelas empresas”, o que não é contabilizado nesse período de doze meses.

Para a Associação Brasileira dos Membros do Ministério Público de Meio Ambiente (Abrampa), a LAE é “incompatível com a necessidade de estudos aprofundados e rigorosos” para projetos de interesse público e submete “decisões que deveriam ser técnicas a pressões políticas”.

Já a Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base afirma defender “procedimentos técnicos necessários no processo de concessão do licenciamento”.

Presidente executivo da entidade, Venilton Tadini disse ao Estadão não fazer sentido fechar os olhos para o risco de danos ambientais irreversíveis em empreendimentos de grande impacto na Amazônia.

Por outro lado, critica a exigência de um novo processo de licenciamento para cada novo projeto na mesma área, como era antes. “É preciso que o histórico de dados de determinada região seja considerado e que se procure ganhar tempo sem comprometer a segurança ambiental.”

O Ministério dos Transportes afirma, em nota, conduzir estudos internos e dialogar com órgãos responsáveis do governo federal pela regulamentação para “dimensionar a aplicação da nova legislação nos projetos estruturantes de rodovias e ferrovias, além de sua integração ao planejamento setorial no âmbito do Plano Nacional de Logística 2050”.

Quais projetos podem acelerar com a LAE?

A pavimentação total da Rodovia BR-319, que liga Porto Velho a Manaus, é motivo de polêmica há décadas. Com cerca de 885 quilômetros de extensão, ela corta a área mais bem preservada da Floresta Amazônica: passa às margens ou em alguns casos pelo meio de 42 unidades de conservação ambiental, 69 reservas indígenas e mais de seis milhões de hectares de terras públicas.

Apenas cerca de 200 quilômetros (no início e no fim da via) são asfaltados. O trecho central é de terra batida e costuma ficar intransitável no período de chuvas. Grande parte do fluxo entre as cidades é feita de barco pelo Rio Madeira e o trajeto leva dias.

A estrada é a única ligação terrestre da capital do Amazonas ao resto do País, e é defendida por moradores e políticos locais, além de representantes da indústria, para facilitar o transporte de mercadorias.

Já na opinião dos ambientalistas, o asfaltamento da estrada aumentaria a destruição do bioma, impedindo o País de cumprir a meta de desmatamento zero até 2030.

Em 2024, Lula se comprometeu a retomar as negociações para reconstruir a rodovia. A medida foi na direção contrária a uma nota técnica emitida pela pasta do Meio Ambiente, de Marina Silva, que apontou risco de elevar a taxa de desmate em até quatro vezes com a obra.

Por ora, a licença prévia para a obra está suspensa por liminar concedida pela Justiça Federal. A decisão atendeu a recurso do Observatório do Clima – grupo de organizações do terceiro setor – em ação civil pública que pede a anulação da licença por inconsistências legais, técnicas e ambientais no processo de licenciamento realizado pelo Ibama em 2022, no governo Jair Bolsonaro (PL).

O projeto capitaneado pelo agronegócio para escoar a produção de grãos pelos portos do Norte do País prevê construir 933 quilômetros de ferrovia entre Sinop (MT) e Miritituba (PA), com a promessa de reduzir emissões por transporte e reduzir custos logísticos.

Desenhado há mais de uma década, o empreendimento teria capacidade de movimentar cerca de 50 milhões de toneladas de grãos, tornando-se um dos grandes indutores do chamado Arco Norte, que hoje funciona principalmente pela BR-163.

Mas não saiu do papel pelos impactos ambientais — principalmente o risco de desmate no Parque Nacional do Jamanxim, reserva no Pará. Também é questionada a falta de consulta pública à população da região durante o estudo de viabilidade técnica, econômica e ambiental – a consulta é uma etapa prevista por tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário.

O andamento do projeto está suspenso desde 2021, após liminar concedida pelo Supremo Tribunal Federal. A União entregou à Corte manifestação que afirma ser possível passar pela área de proteção ambiental respeitando a faixa de domínio da BR-163/MT e documentos para comprovar a consulta prévia a líderes de comunidades, prometendo destinar R$ 715 milhões em contrapartidas ambientais.

Em maio, o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) disse que trabalharia para liberar a construção da ferrovia.

Hidrovias do Madeira e Tocantins-Araguaia

Em estudos no Ministério da Casa Civil, há projetos de concessão de hidrovias como a do Rio Madeira (de Porto Velho, em Rondônia, a Itacoatiara, Amazonas), Tocantins e outras.

A hidrovia do Madeira tem importância estratégica para o agronegócio, principalmente para escoar a produção agrícola de Mato Grosso e Rondônia, mas está com o leilão travado no Senado.

No Rio Tocantins, o Ibama licenciou o derrocamento do Pedral do Lourenço, formação rochosa que restringe a passagem de embarcações de carga, mas a intervenção foi suspensa em junho pela Justiça Federal. O governo do Pará encaminhou ofício no último dia 16 ao governo federal em defesa do empreendimento.

Segundo André Ferreira, diretor-executivo do Instituto de Energia e Ambiente (Iema), o licenciamento desse tipo de projeto normalmente é feito para cada intervenção realizada, como a explosão de rochas ou dragagem de sedimentos para permitir a circulação de embarcações de maior porte.

Com a LAE, ainda não está claro se esses projetos serão liberados de uma só vez. Procurada, a Casa Civil não deu detalhes sobre o processo de licenciamento das hidrovias.

Exploração de petróleo

Há 21 blocos sob contrato na Amazônia Legal e outros 67 em diferentes estágios de oferta (um arrematado no leilão de áreas de petróleo realizado em junho, um em oferta e 65 em estudo para Oferta Permanente de Concessão). Já na costa Amazônica, são 25 blocos já contratados, 19 arrematados no último leilão e outros 249 em estudo, segundo dados do Monitor Amazônia Livre de Petróleo, do Instituto Arayara. Conforme a análise da organização, os blocos sob contrato já estariam aptos ao licenciamento por LAE, e o restante seria igualmente propício à licença especial.

Na prática, devido ao prazo estabelecido na LAE, o licenciamento desses empreendimentos seria mais rápido do que o do bloco da Margem Equatorial da Foz do Amazonas, que gerou impasse entre setores do governo e fez Lula acusar o Ibama de “lenga-lenga” na análise da exploração de petróleo na região.

“Não significa inviabilizar a atividade econômica. Na etapa de planejamento, se estudam várias alternativas para atender à demanda e garantir o fluxo de mercadorias, por meio de projetos que tenham menores riscos sociais e ambientais”, diz André Ferreira, diretor executivo do Instituto de Energia e Ambiente (Iema).

A Petrobras afirma fazer avaliações dos impactos e riscos de suas atividades, incorporando medidas para evitá-los, mitigá-los, compensá-los ou potencializar impactos positivos. “Todas essas medidas e ações são incorporadas nos processos de licenciamentos e atestadas pelo órgão licenciador”, declara a companhia em nota.

Foto: Reprodução/ g1 / Reuters via BBC

Fonte: Estadão

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