+55 (41) 9 8445 0000 arayara@arayara.org

Consórcio Santa Quitéria: aldeias temem contaminação por mina de urânio

Na tarde da última sexta-feira (6), a Comissão de Direitos Humanos e Cidadania (CDHC) da Assembleia Legislativa do Ceará (Alece) realizou uma audiência pública para discutir o Protocolo de Consulta dos Povos Indígenas do Movimento Potigatapuia, composto pelas etnias Tabajara, Potiguara, Tubiba-Tapuia e Gavião. O debate, solicitado pelo deputado Renato Roseno (PSOL), aconteceu no Complexo de Comissões Técnicas da Alece, e se voltou para a Mina de Itataia, que pretende realizar a exploração de urânio e fosfato em Santa Quitéria. 

Representantes da sociedade civil, como a ARAYARA, além de autoridades e organizações, incluindo a Federação dos Povos e Organizações Indígenas do Ceará (Fepoince), a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e o Ministério Público Federal, estiveram presentes na discussão.

O protocolo abrange os povos Tabajara, Potiguara, Tubiba-Tapula e Gavião, reunindo 930 famílias distribuídas em 28 aldeias nos municípios de Monsenhor Tabosa, Boa Viagem, Tamboril, Catunda e Santa Quitéria, que alegam que o empreendimento, cujo licenciamento já está ocorrendo em âmbito federal no IBAMA, está avançando sem a consulta prévia dos povos da região.

O protocolo foi feito dividindo o território em cinco grupos, para a realização das consultas: Katuara, Abá Purang, Mantiqueira, Abá Katemá, Apisá, Apisá. Quase mil famílias, de 28 aldeias. Os povos indígenas do Movimento Potigatapuia abrangem os municípios cearenses de Monsenhor Tabosa, Catunda, Boa Viagem, Tamboril, Santa Quitéria.

Convenção 169

Embora o Consórcio da Mina Itatiaia afirme que as aldeias indígenas estão a mais de 25 km do empreendimento, a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) exige a consulta das comunidades sobre projetos que possam afetar seus territórios.

“Os impactos indiretos, como contaminação de águas e perda de biodiversidade, podem atingir aldeias a longo prazo, ignorando o direito à consulta prévia garantido internacionalmente”, afirmou a representante do Instituto Internacional ARAYARA que participou ativamente da audiência.

Durante a sua apresentação, Renata Prata destacou diversas ações judiciais movidas pela ARAYARA, inclusive o caso Mina Guaíba, que guarda semelhanças com a atual conjuntura em Santa Quitéria, por ter sido em defesa de direitos territoriais de povos indígenas e ter como seu objeto um projeto de mineração.

“Essa ação criou um precedente importantíssimo, podendeo ser considerada uma das decisões mais progressistas na pauta socioambiental no estado do Rio Grande do Sul”, explicou Prata. 

Prata ressaltou que a participação da ARAYARA – maior ONG de Litigância Climática da América Latina – na audiência reforça a importância da mobilização para garantir direitos e preservar o meio ambiente frente aos impactos da exploração da indústria.

Impactos do projeto Santa Quitéria

O Consórcio Santa Quitéria é formado pela Galvani e Indústrias Nucleares do Brasil (INB). O empreendimento propõe um complexo minero-industrial e nuclear em Santa Quitéria, no semiárido cearense. Com uma área diretamente afetada de 380 hectares, o projeto inclui extração de urânio para abastecer usinas nucleares e produção de fertilizantes e ração animal. Estima-se o consumo de 855 m³/h de água, um recurso escasso na região.

A ARAYARA analisou o relatório apresentado pela própria mineradora ao Ibama e encontrou vários pontos conflitantes. Alguns deles, foram considerados preocupantes, como a possibilidade de contaminação dos rios próximos à mina.

“O projeto visa tornar o Brasil autossuficiente nesta área estratégica, entretanto, apresenta uma série de impactos ambientais e sociais significativos nas três etapas de sua implementação: obras, funcionamento e fechamento”, esclarece o diretor-presidente da ARAYARA, Juliano Bueno de Araújo. Ele destaca que o urânio produzido será destinado às usinas nucleares de Angra dos Reis, atualmente dependentes de material importado para operação. 

Apesar do empreendimento reforçar seu discurso de promover geração de empregos e arrecadação de tributos durante seus 20 anos de operação, a engenheira ambiental Daniela Giovana Barros alerta para os impactos ambientais e sociais irreversíveis.

“Esses ganhos são temporários e insuficientes para compensar os potenciais desequilíbrios ambientais e sociais que o projeto pode causar a longo prazo. Impactos como: mudanças na recarga de aquíferos, qualidade do solo e do ar, além de alterações na paisagem e na biota terrestre e aquática, podem ter consequências muito mais sérias do que inicialmente está sendo estimado, ressaltou Barros.

Próximos passos

Como encaminhamento da audiência, ficou definido que o Movimento Potigatapuia, com o apoio do mandato do deputado Renato Roseno, reforçaria as medidas administrativas já adotadas. Entre as ações, estão o envio de ofícios ao IBAMA e à FUNAI solicitando a retomada do processo de demarcação das terras indígenas pertencentes aos povos integrantes do movimento. Além disso, foi recomendado que fosse suspenso o memorando de entendimento firmado pelo consórcio da empresa mineradora responsável pelo projeto em questão.

Compartilhe

Share on whatsapp
WhatsApp
Share on facebook
Facebook
Share on twitter
Twitter
Share on linkedin
LinkedIn

Enviar Comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Redes Sociais

Posts Recentes

Receba as atualizações mais recentes

Faça parte da nossa rede

Sem spam, notificações apenas sobre novidades, campanhas, atualizações.

Leia também

Posts relacionados

Região onde seria instalada a Usina Nova Seival enfrenta crise hídrica e racionamento de água

Conforme reportagem exibida pelo Jornal do Almoço, do Grupo RBS TV, na sexta-feira, 10 de janeiro de 2025, o município de Hulha Negra, no Rio Grande do Sul, enfrenta racionamento de água potável devido à estiagem que atinge a região. O fenômeno La Niña, responsável pela redução significativa das chuvas, tem agravado a crise hídrica no território. Por: John Würdig,

Leia Mais »

ARAYARA e ALADTI: união em defesa dos direitos indígenas e do meio ambiente na América Latina

Diante da crescente violência estrutural contra defensores e defensoras indígenas e ambientais no Brasil e em toda a América Latina, o Instituto Internacional ARAYARA reafirma seu compromisso com a preservação do meio ambiente e a proteção dos direitos humanos. Desde novembro de 2024, a organização passou a integrar a Aliança Latino-Americana de Defensores e Defensoras de Terras Indígenas (ALADTI), uma

Leia Mais »

Com sanção do PL 576/21, setor eólico vê momento favorável para investimentos no RS

Após a sanção do Projeto de Lei nº 576, de 2021, que disciplina o aproveitamento de potencial energético offshore, pelo presidente Lula, na sexta-feira (10), o setor de eólicas gaúcho celebra um “momento único” para oportunidades e investimentos no Rio Grande do Sul. A avaliação é da presidente do Sindienergia-RS, Daniela Cardeal. “Estamos provocando o governo estadual e os agentes

Leia Mais »