por Comunicação Arayara | 29, maio, 2024 | Energia |
No Dia Mundial da Energia, 29 de maio, Anton Schwyter, gerente do Departamento de Energia do Instituto Arayara, nos convida a ir além da discussão sobre os combustíveis fósseis.
“Se falamos em uma transição energética justa e sustentável, é imprescindível que levemos em consideração os sistemas sociais, e isso inclui, em um primeiro momento, a consciência dos direitos políticos dos consumidores de energia, que são diversos, heterogêneos e indispensáveis no debate.”
Quando falamos em transição energética, é comum que pensemos na substituição de combustíveis fósseis por fontes renováveis de energia; ou seja, pensamos imediatamente nos sistemas naturais. Porém, se falamos em uma transição energética justa e sustentável, é imprescindível que levemos em consideração os sistemas sociais, e isso inclui, em um primeiro momento, a consciência dos direitos políticos dos consumidores de energia, que são diversos, heterogêneos e indispensáveis no debate.
Para darmos conta de realizar uma transição energética que seja justa, aplicar os conceitos da justiça energética nos fará caminhar na direção almejada. E para aplicar a justiça, precisamos identificar onde a injustiça prevalece. Segundo dados de 2019 do IBGE, 99,8% da população diz ter energia elétrica. A partir disso, entendemos que não se trata de ter ou não acesso à distribuição, mas, da qualidade do serviço, no valor pago por ele, e no modo como ele é realizado; são nesses três fatores onde perceberemos a injustiça energética atuando no Brasil.
No que tange à qualidade do serviço, sabemos que, entre a população urbana, por exemplo, áreas vulnerabilizadas como comunidades de favela ou periféricas enfrentam mais constantemente quedas de energia; inconstâncias no sistema; ou dificuldades no acesso a informações precisas sobre o serviço prestado pelas distribuidoras. Além disso, muitas vezes essa população paga valores que excedem em muito a sua capacidade de pagamentos, uma superfaturação ocasionada pela precariedade da infraestrutura ou instabilidade do sistema, quando, na contramão disso, teriam direitos a subsídios de atenuação dos valores, como tarifas sociais. Sobre esse aspecto, aliás, já conseguimos detectar uma grave distorção orçamentária de parte dos planejadores: um montante maior dos incentivos e subsídios contidos nas tarifas de energia elétrica atualmente é destinado a outras classes e categorias de consumidores de energia, em detrimento daquele destinado a compor a tarifa social.
A injustiça energética também ocorre quando essas pessoas não são integradas nas decisões sobre a distribuição de energia em seus territórios. Elas têm, ainda que invisibilizado, o direito de fazerem parte das tomadas de decisões, de compartilharem suas experiências, de apresentarem soluções inovadoras que estejam mais alinhadas com suas realidades cotidianas etc, a fim de combaterem a ineficiência energética que lhe tem sido imposta, além da pobreza energética, que é quando as famílias pagam mais de 10% de sua renda familiar à conta de energia.
Segundo o relatório “Eficiência energética nas favelas”, realizada pelo coletivo Rede Favela Sustentável com 4.163 pessoas de 15 comunidades do Rio de Janeiro e região metropolitana, mais da metade das famílias que responderam ao questionário vive abaixo da linha da pobreza (ganham até 1 salário mínimo e meio por mês), e caso a conta de energia dessas pessoas baixasse pela metade, 69% delas responderam que utilizariam o dinheiro disponível para a compra de alimentos. Com isso, é possível afirmar que a pobreza energética pode, inclusive, estar relacionada à insegurança alimentar, comprometendo, ainda, os outros direitos humanos básicos que se seguem ao acesso à comida saudável e de qualidade, como o direito à saúde, à segurança, ao ir e vir… O relatório é contundente ao dizer que a ineficiência e a pobreza energética acabam funcionando como uma ferramenta de injustiça e de violação de direitos humanos.
Além da população urbana vulnerável, em termos socioeconômicos, a injustiça e a pobreza energética também afetam outros grupos socialmente vulnerabilizados, como os povos indígenas, povos das florestas, quilombolas, ribeirinhas e ribeirinhos, entre outros. São comunidades cujo estilo de vida e cosmovisão podem diferir do estilo de vida e cosmovisão da parcela de pessoas que atualmente tomam as decisões a respeito da política energética do país, o que nos apontaria que as necessidades do primeiro grupo talvez não sejam as que estão sendo implementadas pelo último grupo.
Para alcançarmos uma política energética justa e sustentável, precisamos sim transitar para uma matriz 100% renovável, não baseada em fósseis, mas além disso, também devemos considerar as diversas necessidades das diferentes comunidades e grupos sociais, a fim de implementar políticas políticas que sejam justas para cada um, de acordo com suas realidades. Assim todas e todos poderão ter acesso digno à energia: limpa, barata e eficiente, condizente ao seu dia a dia.
por Comunicação Arayara | 27, maio, 2024 | Justiça Energética |
Na luta por justiça climática, por meio do potencial das favelas como comunidades sustentáveis, Arayara e parceiros se juntaram à comitiva da Rede Favela Sustentável para, entre os dias 27 e 29/05, em Brasília, realizar uma ação no Congresso Nacional e atividades públicas por justiça energética nas comunidades.
A Rede Favela Sustentável, formada por centenas de mobilizadores comunitários de 295 favelas e comunidades do estado do Rio de Janeiro, estará representada por uma comitiva de 26 integrantes em Brasília na próxima semana (27 a 29/05).
A Rede busca fomentar qualidades já existentes nas favelas em uma agenda intensa em Brasília durante a Semana Mundial da Energia, para travar diálogos focados em pautas para uma transição energética com justiça socioambiental no Brasil e enfrentamento do racismo ambiental. A Arayara é uma das organizações da sociedade civil que apoiam a iniciativa, somando-se a esta ação de mobilização, debate e engajamento nacional sobre energia limpa e justa. Outras organizações da sociedade civil que trabalham o tema de justiça energética e energia solar social também farão parte, como a Revolusolar, ClimaInfo, Inesc e Instituto Pólis.
Para Juliano Bueno, diretor técnico do Instituto Internacional Arayara, é importante que a ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica) tenha mais compromisso com as comunidades que moram em favelas, “são consumidores que hoje recebem uma energia elétrica de baixa qualidade, com muita variação de tensão e cortes recorrentes, e que tem uma infraestrutura precária que impede que a mesma possa gerar sua própria energia elétrica com painéis solares”, enfatizou o diretor técnico do Arayara que é uma organização da sociedade civil especialista em transição energética, direitos e justiça climática .
O grupo que vem pesquisando e gerando soluções para energia nas favelas e publicou, em 2023, a pesquisa “Eficiência Energética nas Favelas”, pretende fomentar o debate acerca de três temas centrais: renovação das concessões de energia elétrica, tarifa social e energia solar social, oferecendo uma visão inédita da injustiça energética presente em seus territórios.
O relatório representa uma iniciativa de geração cidadã de dados em quase 1.200 domicílios, de 15 favelas do estado do Rio de Janeiro, que, juntas, representam mais de 1,2 milhão de habitantes.
Segundo Kayo Moura, responsável pela análise apresentada no relatório, o mais interessante foi entender que, ao falar do debate sobre eficiência energética nas favelas, nas periferias, no Sul Global, está se promovendo um debate sobre justiça e acesso à energia. “Se tivesse que definir o relatório em um argumento, seria: a ineficiência energética acaba funcionando como uma ferramenta de injustiça energética, sobretudo nas favelas do Brasil”, destaca Moura.
A Comitiva participará ainda, durante a semana de incidência política, de reuniões no Ministério de Minas e Energia, ANEEL, Ministério das Cidades e com a Frente Parlamentar Ambientalista do Congresso Nacional.
Serviço:
Segunda-feira, 27 de maio
Horário: 9-12h
Descrição: Lançamento da Semana Mundial da Energia—Reunião Pública no Congresso: “Justiça Energética nas Favelas: Dados e Soluções da Ponta” –
Local: Plenário 16 do Anexo II da Câmara dos Deputados
Quarta-feira, 29 de maio
Horário: 8h – 9h30
Descrição: Ato por uma Transição Energética Justa: Energia Solar Social e Justiça Energética (Representantes de mais de 10 organizações da sociedade civil se reunirão com faixas e bandeiras para chamar atenção sobre o tema)
Local: Gramado do Congresso Nacional
Horário: 10-13h
Descrição: Organizada pela Comissão Permanente de Minas e Energia, Audiência Pública no Congresso Nacional sobre “Transição Energética Justa: Papel Social da Energia Solar”
Local: Plenário 14 do Anexo II da Câmara dos Deputados
Saiba mais sobre alguns integrantes da Comitiva:
Luis Cassiano do Teto Verde Favela vai apresentar a experiência do teto verde no Parque Arará, Zona Norte do Rio, onde a temperatura abaixo do seu teto, no verão, diverge dramaticamente dos seus vizinhos.
Otávio Barros da Cooperativa Vale Encantado compartilhará a história do biossistema responsável pelo tratamento do esgoto da comunidade Vale Encantado, e do biodigestor que gera gás na cozinha da cooperativa, além dos seus painéis solares.
Nill Santos contará a história de sua Associação de Mulheres de Atitude e Compromisso Social, para mulheres vítimas de violência, que achou na energia solar uma forma de geração de renda e independência.
Dinei Medina a partir de sua experiência na primeira cooperativa de energia solar em favelas do Brasil, a Revolusolar, provocará a compreensão sobre como o potencial que a geração distribuída realizada nas favelas, pode impactar toda a sociedade.
Confira os dados de destaque da pesquisa:
Sobre Eficiência e Qualidade do Acesso
- 55,2% das pessoas representadas na pesquisa se encontram abaixo da linha da pobreza.
- 41,5% das famílias que ganham até meio salário mínimo ficaram, nos últimos 3 meses, mais de 24 horas sem luz.
- 32,1% já perderam eletrodomésticos pelas falhas na rede elétrica.
- As famílias pagam, em média, duas vezes mais do que a capacidade de pagamento.
- 31% das famílias comprometem uma parcela desproporcional do orçamento familiar com a conta de luz.
- 69% gastariam mais com comida caso a tarifa fosse diminuída.
- Os dados evidenciam o ‘gato’ como o único mecanismo para acessar energia entre os mais pobres. Conforme a renda aumenta, a maioria das famílias afirma não ter ‘gato’.
- 68,7% não conhecem a Tarifa Social de Energia Elétrica (TSEE).
- 59,55% das famílias atendem ao critério de renda para usufruir da Tarifa Social, entretanto somente 8,04% afirmaram receber o benefício.
- 73% das famílias que ganham até meio salário mínimo afirmaram não fazer reclamações ou solicitar serviços para a concessionária. Conforme a renda aumenta, o conforto em buscar a concessionária aumenta: só 33% dos acima de quatro salários dizem não fazer reclamações à concessionária.
Sobre Aparelhos e Hábitos Eficientes
- O ar condicionado é responsável por mais da metade (51,4%) do consumo de energia na amostra.
- Entre os entrevistados, 78% sempre lembra de apagar a luz ao sair de um ambiente e 67% dá preferência a lâmpadas LED.
- 50,6% afirmaram saber o significado da Etiqueta Nacional de Conservação de Energia (ENCE).
Acesse a pesquisa completa aqui
Fotos: Comunidades Catalisadoras