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Entenda a MP 1212 no debate da política energética brasileira

Entenda a MP 1212 no debate da política energética brasileira

Tramitando no Congresso Nacional, a Medida Provisória das Energias Renováveis e de Redução do Impacto Tarifário (MP 1212/2024) já recebeu emendas construtivas, emendas “jabutis”, Projeto de Lei solicitando sua anulação; tudo isso como saídas estratégicas para se legislar acerca da política energética do país.

Entenda o que está em jogo nessa discussão tarifária, e como a construção de uma política energética justa e sustentável está implicada nessa movimentação.

A Medida Provisória das Energias Renováveis e de Redução do Impacto Tarifário (MP 1212/2024), assinada pelo Presidente da República e pelo Ministro de Minas e Energia em 9 de abril, estabelece a operação que viabiliza a utilização dos recursos provenientes da privatização da Eletrobrás para quitar empréstimos e abater valores atualmente diluídos em forma de tarifas na conta de luz.

Segundo o Ministério de Minas e Energia (MME), a Medida propõe uma maneira de aliviar o bolso dos consumidores de energia, limitando os ajustes anuais a uma faixa de 3,5% a 5%. A MP também dispõe sobre projetos de energia eólica e solar no nordeste do Brasil: construções, prazos, subsídios fiscais e seu aproveitamento no sistema de distribuição elétrica.

Para o Departamento de Energia do Instituto Arayara, a Medida pode até baratear – ou limitar a um pequeno aumento – a conta de energia elétrica para os consumidores no curto prazo, porém, no longo prazo, os valores hoje abatidos voltarão a crescer, incluindo ainda as taxas administrativas e os juros futuros dessa operação. Ou seja, não é uma medida eficaz e não toca no cerne da discussão sobre os encargos pagos atualmente nas contas de energia, como a tarifa para subsidiar fonte fóssil, como o carvão; a produção rural ou irrigação; as empresas de saneamento; a Geração Distribuída, entre outros. 

No que tange ao impulsionamento a fontes renováveis, a MP 1.212/2024 estende o prazo para que se dê início às atividades de geração de energia dos empreendimentos que já possuem contratos firmados com a União, além de benefícios fiscais para viabilizar obras ou custear processos para sua instalação.

O objetivo seria apoiar a consolidação dessa indústria, alocando mais fontes limpas na matriz energética brasileira. Diferentes emendas tratando sobre o aproveitamento dessa potência, incentivando ou dificultando sua inserção no Sistema Interligado Nacional (SIN), também foram anexadas à Medida Provisória em seu trâmite.

Porém, até mesmo esse investimento para os projetos de energia renovável da região Nordeste, previsto na Medida Provisória, é controverso. Para o gerente do Departamento de Energia e Clima do Instituto Arayara, Anton Schwyter, “se a intenção é não prejudicar os investimentos em energia renovável na região – pois a Medida Provisória prorroga por mais 3 anos os subsídios concedidos a empreendimentos de geração de energia renovável solar e eólicos em relação ao custo de transmissão que seriam extintos já em 2025 – esta decisão política deveria então fazer parte do Orçamento da União, porque da forma adotada servirá para aumentar ainda mais o valor da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) – o grande encargo da tarifa final de energia elétrica – dos próximos 3 anos, pelo menos, aumentando, assim, a conta de luz, ao final (a estimativa é de um impacto de pelo menos 2,3% ao ano)”, avaliou.

Conclusão: tanto a proposta de se utilizar os recursos da Privatização da Eletrobrás para reduzir diretamente os encargos à CDE que são pagos na conta de energia pelo consumidor; quanto a de se utilizar os recursos da privatização para sanar empréstimos realizados em 2020 e 2022 no contexto da pandemia de Covid e da escassez hídrica, respectivamente; ou ainda a proposta de subsidiar investimentos em projetos de energia limpa, todas essas iniciativas anunciadas pela Medida Provisória 1212 aumentam, no longo prazo, a conta de energia. O alívio que ela poderia trazer seria sentido de imediato, para piorar a situação depois.

MP 1212 e suas emendas vs. Lei da Privatização da Eletrobrás e seu jabuti

Depois de assinada, a Medida Provisória recebeu 175 emendas de deputados e senadores. Como o texto vigora com força de lei e com caráter de urgência, jabutis que podem comprometer a política energética justa e sustentável que o Instituto Arayara e a sociedade almejam têm a chance de aparecer via emendas propostas por deputados e senadores, mas também outros jabutis já legislados podem ter a chance de cair.

Aproveitando a discussão central da MP, de reduzir o que é pago no país com eletricidade e impulsionar a geração renovável, o Instituto de Defesa de Consumidores (Idec) enviou contribuições a diversos parlamentares com sugestões de emendas à MP que pudessem combater falsas soluções climáticas, como o jabuti inserido na Lei de Privatização da Eletrobrás (14.182/2021) que adicionou a condicionante de obrigatoriedade à contratação de termelétricas movidas a gás.

Essa condicionante na lei é maléfica, pois esse tipo de energia provocaria o aumento da tarifa de energia de forma gradual, podendo alcançar 12,5% no ano de 2030.

No que tange aos impactos ambientais, essa energia contratada também significaria um aumento das emissões acumuladas em cerca de 53% entre 2022 e 2036, segundo estudo do Idec. Ainda que frequentemente o gás natural e as usinas a gás sejam considerados pelo setor de energia como uma opção “menos poluente” pois a queima desse combustível fóssil emite menos gases de efeito estufa, e, com isso, despontarem no cenário como uma “solução climática” para o período de transição energética, devemos considerar que, também no longo prazo, o metano que escapa nessa produção é um vilão muito mais danoso ao aquecimento global – essa molécula na atmosfera retém 80% mais calor do que moléculas de CO2 em um período de 20 anos.

Assim, para além do texto central da Medida Provisória, as emendas anexadas à MP 1212 também desempenham um papel estratégico na agenda da transição justa, podendo impulsioná-la ou comprometê-la.

As sugestões enviadas pelo Idec basearam o protocolo de cinco emendas à MP, apresentadas pelos deputados Kim Kataguiri (União Brasil/SP), Duda Salabert (PDT/MG), João Carlos Bacelar (PL/BA), Erika Hilton (PSOL/SP) e pelo senador Weverton (PDT/MA).

E o PL 1.956/2024, o que tem a ver?

O Projeto de Lei 1956/2024, apresentado à Câmara dos Deputados em 21 de maio pelo deputado José Guimarães (PT/CE), solicita a revogação da Medida Provisória das Energias Renováveis e de Redução do Impacto Tarifário (MP 1212/2024). Mas o PL expõe duas questões: uma é apresentar o mesmo texto da Medida Provisória, ainda que pedindo sua anulação; e a segunda questão é apresentar o mesmo texto, porém com um pequeno acréscimo (ou jabuti): um dispositivo que determina a obrigatoriedade da inclusão das usinas a carvão em leilões de reserva de energia.

A ação foi considerada como uma “medida de proteção” à MP, no caso dela não tramitar dentro do prazo estabelecido de 120 dias desde sua assinatura para poder vigorar, além de uma medida de advogar pela indústria do carvão, que sofreu recente retrocesso no Congresso Nacional quando parlamentar gaúcho reconsiderou suas atuações em face às mudanças climáticas e o desgaste ao clima provocado pelas fontes fósseis, principalmente no contexto do pós-enchente do Rio Grande do Sul.

Em coletiva a jornalistas, o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, disse que não acompanhou o Projeto de Lei, mas que o deputado José Guimarães, autor do PL, esteve com ele na semana passada. “Ele defende realmente que o carvão social da região Sul do Brasil é fundamental para que gere emprego e renda e que essa fonte energética continue sendo considerada no planejamento. Isso tudo vai ser avaliado no momento adequado. Toda iniciativa parlamentar é muito bem-vinda, mas vamos buscar a compreensão daquilo que é trazer o melhor custo-benefício para a sociedade brasileira”, afirmou o ministro.

Para o gerente de Energia do Instituto Arayara, “Considerar o carvão como social é um grande contrassenso, uma vez que esse tipo de fonte de energia é caro, necessita de subsídio, contribui para emissão de gases de efeito estufa, e também prejudica enormemente o equilíbrio do meio ambiente. Ou seja, além de ser caro, é um tipo de energia suja”, pontuou Schwyter.

A Arayara reforça a necessidade de serem avaliadas com cautela as consequências a médio e longo prazo das Medidas Provisórias e Projetos de Lei que legislam sobre o cenário energético do país, especialmente em um momento em que se almeja construir um futuro energético com menos emissões de gases de efeito estufa.

Sol, fonte promissora de geração de energia no Brasil

Sol, fonte promissora de geração de energia no Brasil

O dia 3 de maio é celebrado como o Dia do Sol, uma data significativa para lembrar da importância da energia solar na transição para um futuro mais limpo e sustentável. No Brasil, a geração distribuída de energia solar vem ganhando destaque como uma alternativa eficiente e acessível para a democratização da energia elétrica.

A geração distribuída consiste na produção de energia elétrica a partir de fontes renováveis, como a solar, por meio de pequenos sistemas instalados em residências, empresas ou comunidades. Dessa forma, a energia é produzida e consumida localmente, sem a necessidade de grandes usinas ou linhas de transmissão, o que garante maior autonomia e segurança energética para as comunidades.

Um exemplo bem-sucedido de geração distribuída de energia solar no Brasil é o projeto Luz para Todos, que leva eletricidade para comunidades rurais e isoladas por meio da instalação de sistemas fotovoltaicos. Desde o lançamento do programa, em 2003, mais de 16 milhões de pessoas já foram beneficiadas com acesso à energia elétrica, transformando a vida dessas pessoas e promovendo a inclusão social.

Além disso, a geração distribuída de energia solar também tem se mostrado uma alternativa viável para a redução das contas de energia elétrica. De acordo com um estudo da Agência Internacional de Energia Renovável (IRENA), a geração distribuída pode reduzir os custos da eletricidade em até 50% em comparação com o modelo tradicional de geração centralizada.

Portanto, a geração distribuída de energia solar é uma opção promissora para a democratização da energia no Brasil, garantindo acesso à eletricidade para comunidades isoladas e reduzindo os custos da energia elétrica para as famílias e empresas. É importante que o governo e a sociedade civil continuem incentivando e investindo nessa alternativa limpa e sustentável de produção de energia elétrica.

E na balança dos impactos socioambientais, o que deve ser levado em conta?

A geração distribuída de energia solar pode apresentar ônus ambientais e sociais em sua cadeia produtiva e instalação. Abaixo, apresento algumas referências que abordam essas questões:

No que diz respeito aos impactos ambientais, um estudo publicado na revista Renewable and Sustainable Energy Reviews em 2018 avaliou a sustentabilidade ambiental da produção de energia solar fotovoltaica. O estudo destacou que a extração de minerais e metais para a produção dos painéis solares pode gerar impactos negativos no meio ambiente, como contaminação de água e solo, e destacou a importância de aprimorar as práticas de produção para minimizar esses impactos.

Em relação aos aspectos sociais, um artigo publicado na revista Energies em 2017 analisou a inclusão social na transição energética no Brasil e destacou que a geração distribuída de energia solar pode gerar desigualdades em relação ao acesso à energia elétrica, especialmente para famílias e comunidades de baixa renda. O estudo ressaltou a importância de políticas públicas que promovam a inclusão social na produção de energia solar.

Além disso, um estudo publicado na revista Journal of Cleaner Production em 2019 avaliou os desafios e oportunidades da geração distribuída de energia solar no Brasil. O estudo destacou que a instalação de sistemas de geração distribuída pode gerar desafios em relação à regulamentação e à gestão dos resíduos gerados pelos painéis solares, mas também apontou oportunidades para a inclusão social e o desenvolvimento local por meio da produção de energia solar.

É importante ressaltar que a transição energética para fontes limpas e sustentáveis requer o equacionamento dessas questões, para que a produção de energia solar possa ser cada vez mais inclusiva e sustentável.

Quais são as políticas energéticas brasileiras que abarcam a geração solar?
No Brasil, existem diversas políticas, programas e regulamentações que incentivam, embasam e regulamentam a geração de energia solar, tanto em escala centralizada (usinas solares de grande porte) quanto em escala distribuída (geração solar em residências, comércios e indústrias). Algumas das principais são:

Resolução Normativa 482/2012: esta resolução da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) regulamenta a geração distribuída de energia elétrica no Brasil, incluindo a geração solar fotovoltaica. Ela estabelece as condições para a conexão de sistemas de geração distribuída à rede elétrica, incluindo a possibilidade de os consumidores gerarem sua própria energia e injetá-la na rede em troca de créditos na conta de luz.

Programa de Desenvolvimento da Geração Distribuída de Energia Elétrica (ProGD): lançado em 2014, este programa do Ministério de Minas e Energia tem como objetivo incentivar a geração distribuída de energia elétrica no país, incluindo a solar fotovoltaica. Entre as medidas previstas estão a simplificação dos procedimentos de conexão à rede e a definição de regras claras para o cálculo dos créditos na conta de luz.

Programa Nacional de Energia Renovável (RENovaBio): lançado em 2017, este programa do governo federal tem como objetivo incentivar a produção de biocombustíveis e outras fontes renováveis de energia, incluindo a solar fotovoltaica. O programa prevê a criação de metas anuais de redução de emissões de gases de efeito estufa e a emissão de certificados de descarbonização (CBIOs) para as empresas que cumprirem essas metas.

Linhas de financiamento para energia solar: diversas instituições financeiras, como o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e o Banco do Nordeste, oferecem linhas de financiamento para a instalação de sistemas de energia solar fotovoltaica em residências, comércios e indústrias. Esses financiamentos incluem desde a aquisição dos equipamentos até a instalação e a conexão à rede elétrica.

É importante ressaltar que o desenvolvimento do setor depende não apenas dessas medidas, mas também de investimentos em pesquisa e desenvolvimento, capacitação técnica e conscientização da sociedade sobre a importância da transição para fontes de energia limpa e sustentável.

 

Principais desafios para o Brasil

A geração de energia solar no Brasil ainda enfrenta diversos desafios que dificultam sua implementação em larga escala e a transição para abandonar as fontes não renováveis. Alguns dos principais problemas são:

Custo elevado: apesar de o custo da energia solar ter caído significativamente nos últimos anos, a instalação de sistemas fotovoltaicos ainda requer um investimento inicial elevado, o que pode ser um obstáculo para a adoção da tecnologia por parte de consumidores residenciais, comerciais e industriais.

Falta de incentivos fiscais: embora existam linhas de financiamento para a instalação de sistemas de energia solar, o Brasil ainda carece de incentivos fiscais para o setor, como isenção de impostos e taxas de importação de equipamentos.

Regulamentação complexa: apesar da Resolução Normativa 482/2012 da ANEEL, que regulamenta a geração distribuída de energia elétrica no Brasil, muitas empresas ainda enfrentam dificuldades para se conectar à rede elétrica e para obter autorização para a instalação de sistemas fotovoltaicos.

Capacitação técnica: é necessário investimento na capacitação técnica da sociedade para a formação destes novos profissionais para a instalação e manutenção de sistemas de energia solar que requerem conhecimentos específicos. Este é um grande potencial para a geração de emprego e renda.

Dependência das fontes não renováveis: o Brasil ainda depende em grande parte da geração de energia a partir de fontes não renováveis,termelétricas a carvão mineral, gás natural e diesel. A transição para fontes de energia limpa e renovável exige investimentos em infraestrutura e tecnologia que nem sempre são prioritários para o governo e para o setor privado.

 

Plano Nacional de Energia 2050

Um dos documentos mais importantes e abrangentes produzidos no Brasil sobre a democratização do acesso à energia e a transição justa é o Plano Nacional de Energia 2050 (PNE 2050), elaborado pelo Ministério de Minas e Energia em 2020.

O PNE 2050 apresenta um conjunto de diretrizes, metas e ações para orientar a expansão da matriz energética brasileira até 2050, com foco na sustentabilidade, na segurança energética e na inclusão social. O documento inclui um capítulo específico sobre a geração distribuída de energia elétrica, que destaca a importância da tecnologia para a democratização do acesso à energia e para a redução das desigualdades regionais e sociais no país.

O Plano Nacional de Energia 2050 foi elaborado a partir de um amplo processo de participação e consulta pública, que contou com a colaboração de especialistas, representantes de governos estaduais e municipais, da sociedade civil, do setor empresarial e de outros segmentos da sociedade brasileira. O documento é uma importante referência para orientar políticas públicas e iniciativas privadas relacionadas à geração de energia solar e à transição justa no Brasil.

O PNE 2050 estabelece como meta para 2050 que a geração distribuída alcance 24% da capacidade instalada de geração elétrica no Brasil. Para atingir essa meta, o documento propõe diversas ações de incentivo à geração distribuída de energia, incluindo a criação de linhas de financiamento, a simplificação das regras de conexão à rede elétrica e a implementação de políticas de estímulo à micro e minigeração distribuída.

O documento também destaca que a geração solar fotovoltaica tem um grande potencial de expansão no Brasil, dado o elevado nível de radiação solar no país e a redução do custo dos equipamentos. O PNE 2050 projeta que a capacidade instalada de geração solar fotovoltaica no Brasil pode chegar a 222 GW em 2050, o que corresponderia a cerca de 36% da capacidade total de geração elétrica no país.

 

Referências:
Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL). Geração distribuída. Disponível em: https://www.aneel.gov.br/geracao-distribuida

Agência Internacional de Energia Renovável (IRENA). Distributed Renewable Energy: A Catalyst for Rural Electrification in the Global South. Disponível em: https://www.irena.org/-/media/Files/IRENA/Agency/Publication/2017/Oct/IRENA_Distributed_Renewable_Energy_2017.pdf

Ministério de Minas e Energia. Programa Luz para Todos. Disponível em: http://www.mme.gov.br/luz-para-todos

Renewable and Sustainable Energy Reviews
https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S1364032118305638

Revista Energies
https://www.mdpi.com/1996-1073/10/10/1614

Journal of Cleaner Production
https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0959652619304112